Flávio Hastenreiter
A afetividade é uma das dimensões humanas mais importantes. Em qualquer plano da existência humana, não há nenhum afeto que não possua uma ressonância. A afetividade é fonte de nossas lembranças, das marcas que carregamos de nossas vivências, que são as nítidas expressões de nossos pensamentos, sentimentos, de nossas crenças e atitudes. São os afetos, que por meio de nossa vivência, vão construindo nosso modo de ser e interagir no mundo.
Nossa vida se sustenta através dos sentimentos. São eles que tonalizam nossa relação com as coisas. A relação consigo mesmo, com os outros e o mundo. São eles que fazem com que saibamos que não estamos sozinhos, que compartilhamos algo com alguém. Os sentimentos são as conexões que estabelecemos com as coisas e que nos dão a sensação de pertencer a algo neste mundo: pertencer a uma família, a grupo de amigos, a uma pessoa que amamos, entre outros grupos. Nesses campos, entra em cena os sentimentos que, como diz Damásio, são fontes de dor ou prazer que alicerçam nossa mente.
Nesse sentido, podemos dizer que os sentimentos também são presença marcante nas relações insatisfatórias e sofridas que construímos ao longo da vida. Relações que nos tornam prisioneiros ou, por outro lado, carcereiros. Vínculos que nos privam da liberdade. Não somente em relações amorosas, mas também naquelas relações que aprisionam nossas angústias e nos tornam prisioneiros de nós mesmos, como nas relações de trabalho, relações familiares, enfim, em todo nosso ciclo de relações humanas onde há a emergência do sofrimento.
Essas relações e os sentimentos que a acompanham, muitas vezes tornam-se fardos pesados de se carregar sozinho e, nesses casos, precisamos de alguém que nos ajude a aliviá-las ou compreendê-las. A identificar o modo distorcido, que na maioria das vezes, enxergamos uma situação e que faz com que a interpretamos de uma maneira que nos faz sofrer ainda mais.
Existem ainda, alguns sentimentos com tonalidades mais cruéis como o ódio, a inveja, o ciúme, a culpa, a vergonha, o sentimento de inferioridade. Todos esses sentimentos podem ser motivadores de grandes tragédias. O curioso é que eles também são responsáveis pelo movimento da vida. O ciúme possui um caráter romântico, que dá um sabor ao relacionamento, mas pode ser devastador quando no extremo se torna a paixão perigosa, quando a posse do outro for o alvo principal e o sentimento de ser desejado(a) toma um caráter quase que animalesco. O que dizer então da inveja, da culpa e outros mais… Sentimentos que todos temos, mas que são difíceis de admiti-los ou identificá-los quando estamos envolvidos em determinadas situações em que nossa visão distorce a realidade dos acontecimentos.
Dizem que um dos sentimentos mais supremos se chama: AMOR. Existem muitas explorações a respeito do que seja esse sentimento, muitas estórias, muitos mitos. Poderíamos afirmar, sem sombra de dúvidas, que a maioria hoje vive a partir do mito do amor, talvez sem nunca o conhecerem de verdade. Para alguns o amor implica uma atividade, um exercício, uma doação sem nunca pretender nada em troca, quem ama uma pessoa deve ser capaz de amar qualquer pessoa. Será esta uma atividade de doação autêntica, já que mesmo não sendo amado, ainda assim dou amor? Ou será esta uma questão onde não cabe uma medida, já que “a medida de amar é amar sem medida”? Isso não é nada fácil de compreender, muito menos de vivenciar.
O amor talvez seja um desconhecido em nosso arranjo social da atualidade, já que ele tornou-se um produto a ser vendido. Talvez seja esse um dos fatores pelo qual muitos relacionamentos se esvaem como fumaça. A promessa do amor que a mídia oferece é falsa. O amor é uma intimidade, uma cumplicidade e acima de tudo, uma simplicidade. Como já disse Lya Luft “Que seja cumplicidade, porque a vida é difícil sem afetos”.
O amor é produzido no entre da relação, e está sujeito às contradições que dela brotar. Mas, sustentam expectativas, vendem uma imagem ideal de amar, uma idealização que passa longe de seu real significado. Coisas que sempre estarão fadadas ao fracasso.
O postulado mais básico do amor se chama reciprocidade, pois com ele há um processo de convivência e mútua compreensão e, desse modo, o amor se torna um bem supremo e só assim perdura no tempo.