Por que rituais causados pelo transtorno obsessivo-compulsivo não podem ser ignorados

Jane E. Brody,
The New York Times

As pessoas com TOC sabem que suas ações e pensamentos não são realistas, mas não conseguem evitar esse comportamento.

No filme Melhor É Impossível, de 1997, Jack Nicholson interpreta Melvin Udall, um homem de meia-idade com transtorno obsessivo-compulsivo (TOC) que evita pisar nas rachaduras das calçadas, tranca as portas, mexe nos interruptores exatamente cinco vezes e lava as mãos repetidamente, sempre jogando fora o sabonete depois.

O filme é uma comédia romântica, mas, na vida real, não há nada para rir a respeito do problema que acomete o personagem – afinal, o TOC é incapacitante, tanto social e emocional quanto vocacionalmente.

Pensamentos obsessivos e comportamentos compulsivos ocorrem na vida de todo mundo de vez em quando. Ter padrões estranhos, como organizar temperos em ordem alfabética ou mesmo manter um guarda-roupa estourando de peças e não conseguir se desfazer delas, é comum. Entretanto, esses hábitos são bem diferentes daqueles que caracterizam o TOC: pensamentos ou medos perturbadores que levam a pessoa a seguir um comportamento ritualístico e irracional para aliviar a ansiedade.

Um medo excessivo de germes, por exemplo, pode levar à lavagem repetitiva das mãos ou à recusa de tocar em maçanetas ou objetos manipulados por outras pessoas. Mas, os rituais não precisam necessariamente ter relação com as ansiedades que os desencadeiam, como abrir e fechar portas um número exato de vezes ou contar até um determinado número antes de fazer uma atividade.

Causas ainda são pouco conhecidas

As pessoas com TOC sabem que suas ações e pensamentos não são realistas, mas não conseguem evitar esse comportamento. Manter rituais compulsivos não lhes dá prazer, apenas alívio temporário à ansiedade, resultando na necessidade de repeti-los o tempo todo. Isso pode consumir um tempo enorme, tornando a vida normal quase impossível.

Em um artigo recente no New England Journal of Medicine, o psiquiatra da Universidade de Chicago Jon E. Grant descreveu um rapaz de 19 anos que “lava as mãos cem vezes por dia, não toca nada que foi tocado por outra pessoa sem antes esfregar bem o objeto, e o medo dos germes o deixou isolado em seu quarto, impossibilitado de comer e com vontade de morrer”. Em apenas dois anos, o transtorno “já tinha se tornado completamente incapacitante”, segundo o pai do jovem.

Geralmente, o TOC é um transtorno hereditário, mas a gravidade varia muito dentro da mesma família.

Embora ainda não se saiba muito a respeito das causas, Grant afirma que elas devem estar relacionadas a anormalidades em diversas estruturas e funções cerebrais, incluindo déficit de habilidades cognitivas.

Sem o cuidado adequado, dificilmente o problema se soluciona sozinho. Quanto mais cedo for diagnosticado e tratado, melhores os resultados.

– Apenas 30% dos pacientes de TOC recebem medicação apropriada e menos de 10%, psicoterapia baseada em evidências – afirma Grant.

O tratamento geralmente é dificultado pelo diagnóstico errado de depressão ou ansiedade, já que os sintomas de ambos podem acompanhar o TOC.

Como identificar:

Em um artigo também publicado no New England Journal of Medicine, o psiquiatra do Massachusetts General Hospital Michael A. Jenike sugeriu três perguntas que podem identificar os pacientes com TOC.

Você tem pensamentos repetitivos que o deixam ansioso e dos quais não consegue se livrar, por mais que tente?

Você mantém as coisas extremamente limpas e lava as mãos com frequência?

Você verifica as coisas em excesso?

Tratamento

– De forma adequada, o tratamento permite que de 60% a 85% dos pacientes tenham uma melhora significativa e permaneçam bem durante anos, mesmo que sejam necessárias sessões de reforço.

– As técnicas de terapia cognitivo-comportamental se mostram especialmente eficazes. O método preferido, chamado terapia de exposição e prevenção de resposta, é realizado uma ou duas vezes por semana com até 30 horas no total.

– O paciente é exposto a estímulos que geram ansiedade, a partir dos menos provocativos, e aprende a evitar as reações mais comuns até que o fator mais temido gere uma resposta mínima ou inexistente.

– Outra solução, a chamada terapia cognitiva, ajuda os pacientes a identificarem pensamentos irreais automáticos e mudar sua forma de interpretação.

– Por exemplo, alguém com medo de germes pode ter de tocar objetos sujos sem lavar as mãos e manter um registro de quantas vezes ficou doente depois de fazer isso – até que fique claro que não são os objetos que o fazem adoecer.

– Remédios como antidepressivos também são úteis, embora a terapia cognitivo-comportamental continue sendo o tratamento preferido.

Por Jane E. Brody, The New York Times
Fonte: Jornal Zero Hora

Flávio Hastenreiter
flaviohastenreiter@gmail.com