Orientação Profissional: Biomédicas

O que é

As Ciências Biomédicas, juntamente com as Ciências Biológicas e as Ciências da Saúde, podem ser compreendidas na grande área de saberes conhecidos como Ciências da Vida. As pesquisas nessas áreas, em sua maioria, são multidisciplinares.

Antigamente existiam poucas opções de cursos universitários. Um pesquisador sênior da área biomédica, que tenha hoje em torno de 50 anos, pode ter cursado a graduação em Medicina ou em Biologia. Hoje existem outras opções de graduação, como a Biomedicina, Ciências Biológicas modalidades Médica ou Biofísica, Ciências Moleculares, Biotecnologia, Nanobiotecnologia, enfim, um leque muito maior de opções para quem deseja fazer pesquisa e está pensando sobre o caminho a trilhar.

Muitas vezes, pessoas graduadas em áreas diferentes – Medicina, Biologia ou até mesmo Física – cursam uma mesma pós-graduação – no caso da área biomédica, em Química Biológica, Biofísica, Imunologia ou Microbiologia, entre outras. O físico pode ter interesse em cursar algumas disciplinas voltadas para Nanobiotecnologia, por exemplo. E um biólogo que usa ferramentas de Matemática ou Física pode querer se aprofundar cursando disciplinas da área de Exatas.

Hoje em dia, é esperado que as universidades tenham cursos de graduação flexíveis, exatamente para possibilitar formar profissionais com diferentes perfis. A carreira cientifica é flexível, dá margem a novas interações. É permitido ser criativo!

O que fazem

O leque de possibilidades de carreiras na área biomédica se amplia quando o profissional faz cursos de mestrado e doutorado. Esse nível de formação superior – pós-graduação – é exigido tanto para quem quer dar aulas em universidades como é necessário para quem deseja trabalhar em pesquisa e desenvolvimento de produtos em empresas ou institutos (como a Fiocruz, o Butantã, entre outros).

O foco principal é a pesquisa voltada para o estudo das funções dos seres vivos, especialmente os seres humanos, com o intuito de encontrar as causas e mecanismos das doenças que os afetam, modos de prevenção, diagnóstico e tratamento. São realizadas experiências para verificar efeitos de medicamentos, hormônios, radiações, venenos, drogas ilícitas e outras substâncias em órgãos, tecidos e funções vitais do organismo humano. O tipo de pesquisa realizado pode envolver o desenvolvimento de vacinas contra doenças infecciosas, diagnósticos laboratoriais, propriedades de plantas usadas na medicina popular e síntese de novos remédios, desenvolvimento de terapias antitumorais, novas terapias celulares e genéticas e tem centenas de outras possibilidades.

A atividade de pesquisa exige o uso de luvas, óculos, toucas, jalecos, sapatos e máscaras de segurança, uma vez que o risco de contaminação ou intoxicações é constante. Os laboratórios são mantidos limpos, climatizados e bem iluminados, tanto em empresas como nas universidades e centros de pesquisa.

Com o desenvolvimento dos conhecimentos em Biotecnologia, o mercado de trabalho em empresas vem aumentando. Existem empresas que já estão desenvolvendo métodos de terapia celular, por exemplo, utilizando células-tronco para tratar doenças.

A área de diagnóstico por imagem é outra que vem se ampliando rapidamente: cada vez temos equipamentos mais avançados para fazer imagens do corpo humano. As doenças mais complexas, como o câncer, precisam de diagnóstico precoce e da escolha entre os diversos procedimentos terapêuticos existentes.

Há uma busca permanente pela criação e utilização de novos métodos de tratamento não invasivos, ou seja, aqueles em que não é preciso introduzir nada no corpo humano.

Todos esses campos requerem uma excelente formação do profissional, para que ele possa acompanhar a velocidade das mudanças e ir além, sendo inovador e criativo. O conhecimento é o diferencial que impulsiona a ciência.

Nesse aspecto, é importante destacar que não apenas as aplicações imediatas das pesquisas científicas são interessantes. A pesquisa básica, ou seja, a pesquisa sem um fim imediato, é fundamental para que surjam as coisas novas. Muitas vezes o cientista faz uma descoberta que ainda não sabe para o que serve, mas percebe que aquela ideia tem potencial. E mais à frente, ele mesmo ou outros pesquisadores vão utilizar a sua ideia –muitas vezes, de formas inimagináveis no início da pesquisa!

Áreas de atuação

As áreas de atuação para o profissional da área biomédica são muitas e similares às da área da saúde. Em relação ao ensino e à pesquisa, o biomédico com mestrado e doutorado poderá ministrar diversas disciplinas em universidades, tanto em cursos de graduação como na pós-graduação. Considerando-se o grande número de novas escolas e cursos das áreas biológicas e de saúde que se criam a cada ano no país, esta é uma área de atuação em franca ascensão, especialmente por ser exigido para o ingresso – na maioria dos casos – o título de doutor.

Doenças cardiovasculares

As doenças cardiovasculares – que acometem o coração, bem como os outros componentes do sistema circulatório, como veias, artérias e capilares – são as que mais matam no Brasil, de acordo com a Organização Mundial de Saúde (OMS). Para prevení-las, os clínicos reiteram a importância do desenvolvimento de hábitos saudáveis, com relação especialmente aos cuidados com alimentação, a prática de atividade física, a redução do uso de tabaco e de álcool.

Há fortes implicações sócio-econômicas das doenças cardiovasculares no país, ou seja, elas custam caro ao Estado. Para diminuir os impactos dessas doenças, deve-se investir na identificação precoce de aterosclerose, inclusive em jovens; no controle dos fatores de risco cardiovasculares, citados acima; no desenvolvimento da Biologia Molecular, para definir marcadores de doença e indicadores de risco de eventos como derrames, isquemias etc.; e na educação pública, que deve trabalhar a questão dos estilos de vida, envolvendo mudanças de hábitos. Essas medidas, que não envolvem uso de medicamentos, são mais eficazes e têm menor custo. Evitar as doenças é mais simples e mais barato do que tratá-las.

A hipertensão é provocada pelo desequilíbrio na produção de substâncias vasoconstrictoras (que estreitam os vasos sanguíneos) e vasodilatadoras (que os dilatam), que regulam e estabelecem o nível da pressão arterial. Sabe-se que o desequilíbrio depende de fatores genéticos, responsáveis pela síntese de compostos endógenos que determinam a vasoconstricção e a vasodilatação, e que fatores ambientais como o estresse, o sal, a obesidade e a inatividade física levarão a uma maior ou menor atuação dos elementos de regulação.

Hoje, já se pode fazer o mapeamento de genes candidatos à hipertensão, assim como o estudo do efeito de genes isolados sobre a pressão arterial. Descobriu-se que existem alterações estruturais no gene (polimorfismos) que podem modificar o comportamento do gene, fazendo-o produzir mais uma proteína normal ou produzir uma proteína alterada, que influencia os níveis da pressão arterial e também o grau de hipertrofia cardíaca (aumento do coração).

A hipertensão arterial e a diabetes são as principais causas de doença renal crônica, um exemplo típico de doença não-transmissível que impõe à sociedade um fardo pesado e crescente, uma vez que os pacientes que chegam aos estágios terminais da doença requerem tratamentos dispendiosos, como a hemodiálise crônica (troca de todo ou de parte do sangue do corpo do paciente) e o transplante renal. Este, além da possibilidade de rejeição, enfrenta a escassez da oferta de órgãos: os transplantes de rim no Brasil atendem menos de 10% dos pacientes com doença terminal crônica, que somente sobrevivem com diálise.

Estima-se atualmente que cerca de 80.000 brasileiros necessitem de diálise crônica para sobreviver, número que cresce à taxa aproximada de 7% ao ano. A prevenção primária visa a impedir o desenvolvimento inicial de doença e a prevenção secundária busca impedir que os pacientes já portadores da doença cheguem aos seus estágios terminais, ou tenta ao menos retardar esse processo. Por agir diretamente sobre a população de maior risco, esse nível de prevenção oferece resultados mais imediatos e deve ser perseguida com afinco, requerendo a intensificação da pesquisa biomédica.

Doenças cronodegenerativas

As doenças cronodegenerativas são outro grande campo de pesquisa. No Brasil, o número de idosos vem aumentando, pois os avanços da Ciência fizeram com a que expectativa de vida aumentasse bastante nos últimos anos. Até 2025 serão cerca de 34 milhões brasileiros na faixa acima dos 60 anos, o que corresponde a 15% da população. Este envelhecimento da população traz consigo um grande número de doenças características da idade.

A memória é uma das áreas do organismo humano mais afetadas por essas doenças. Ela ainda é um dos grandes mistérios das Ciências da Saúde, consistindo na gravação, conservação e evocação de informações. Para fazer isso, o cérebro transforma o que recebe, através das experiências da realidade que nos rodeia, em códigos elétricos e químicos aos quais não temos acesso direto, e na hora da evocação retransforma esses códigos, ou o que está codificado neles, em realidade outra vez. Sem a memória não há conhecimento, nada tem importância.

Motivados por essa questão, alguns pesquisadores se interessam em estudar o papel desempenhado por determinadas proteínas durante a consolidação de memórias, procurando entender o processo bioquímico que acontece durante sua evocação, as mudanças de comportamento provocadas no indivíduo, assim como os efeitos que o envelhecimento e a progressão das diferentes doenças neurodegenerativas têm neste processo. Esses estudos, feitos com ratos, são fundamentais para entender a natureza dos transtornos psiquiátricos humanos como as fobias, a depressão e o estresse pós-traumático, bem como para desenhar estratégias de tratamento.

A doença de Alzheimer é outra cuja incidência aumenta com o envelhecimento da população. É uma doença progressiva e neurodegenerativa que provoca dificuldades de comunicação, aprendizagem, raciocínio e pensamento. Causa também mudanças de personalidade, sintomas comportamentais e, principalmente, uma devastadora perda de memória.

Durante 20 anos, os estudos de Alzheimer foram focados na probabilidade de morte das células do cérebro – os neurônios – causada pelo depósito de fibras amilóides, que geravam as chamadas “placas senis”. No desenvolvimento das pesquisas viu-se, porém, que era possível reverter a perda de memória sem reduzir a presença de placas amilóides em camundongos, através de vacina. A possível explicação é que haveria “toxinas” escondidas, os chamados oligômeros protéicos que formarão as placas senis, que levavam não à morte, mas a disfunções neuronais, o que foi comprovado em portadores de Alzheimer.

Outra questão importante envolvendo a doença é a existência de uma deficiência do metabolismo de glicose no cérebro de portadores. Têm sido feitas correlações que indicam um aumento do risco de portadores de Alzheimer desenvolverem diabetes tipo 2 e vice-versa. Pesquisadores comprovaram recentemente uma resistência à insulina nos cérebros de pacientes com Alzheimer, sendo que a insulina e seus receptores desempenham um papel fundamental na aprendizagem e nas funções normais do cérebro. Alguns grupos estão propondo que a doença de Alzheimer pode ser um novo tipo de diabetes, já chamado de diabetes tipo 3.

Alguns cientistas desenvolvem pesquisas especificamente em infarto e envelhecimento celular, utilizando um pré-condicionamento – pequenas isquemias causadas intencionalmente – para prevenir danos cardíacos. O envelhecimento é abordado também do ponto de vista do acúmulo de danos em nossos tecidos, causados por radicais livres, que são moléculas ou átomos que possuem elétrons desemparelhados. Eles podem ser altamente reativos, causando modificações em outras moléculas das nossas células.

Os radicais livres podem ser removidos por substâncias antioxidantes, mas apesar do corpo humano ter sistemas antioxidantes muito eficazes e esse equilíbrio ocorrer naturalmente, eventualmente pode haver um desequilíbrio, gerando um estresse oxidativo. Este estresse pode causar, direta ou indiretamente, várias doenças como infarto, diabetes, doenças inflamatórias, fibrose pulmonar e fibrose cística, câncer, Parkinson, Alzheimer e envelhecimento.

Para prevenir a geração de radicais livres nas mitocôndrias – que são a fonte de energia das células -, o único modo conhecido em animais de laboratório é a restrição calórica, mas não há um mecanismo paralelo no ser humano.

Doenças negligenciadas

Um campo em que os pesquisadores brasileiros se destacam é o das chamadas doenças negligenciadas – a dengue, a doença de Chagas, a hanseníase, a leishmaniose, a malária e a tuberculose. Estas enfermidades são de grande importância sanitária para a América Latina e o Caribe, sendo ao mesmo tempo desafios de saúde pública e oportunidades de pesquisa em ciência e tecnologia.

Por que “negligenciadas”?

Essas doenças atingem principalmente os países pobres, daí o desinteresse das grandes indústrias farmacêuticas com relação ao desenvolvimento de pesquisa para tratá-las. A imigração nos países desenvolvidos, porém, tem aumentado a incidência dessas doenças no primeiro mundo, que tem buscado o conhecimento construído nos países em desenvolvimento, como o Brasil e a Índia.

Vários países pesquisam em conjunto

A Organização Mundial de Saúde (OMS) promove a colaboração entre laboratórios de países afetados por estas doenças, visando o avanço científico. A pesquisa sobre o Trypanosoma cruzi, por exemplo, o protozoário que é o agente causador da doença de Chagas, está muito avançada no Brasil. A doença só existe no continente americano, principalmente na América Latina, porque é onde vive o barbeiro, que é o inseto vetor propagador da doença. Atinge entre cinco e seis milhões de pessoas no Brasil e 16 milhões em toda a América Latina. Existem pacientes que são portadores da doença, mas não têm sintomas e ela só é identificada quando fazem exames de sangue por outros motivos.

Pesquisa foca aspectos específicos das doenças

A doença de Chagas se manifesta de diferentes formas. Pode causar cardiopatias violentas ou formas digestivas da doença: o megacólon e o megaesôfago. Os cientistas que estudam as diferenças entre os tipos de T. cruzi querem entender sua bioquímica e seu metabolismo, visando à elaboração de um quimioterápico que bloqueie seu desenvolvimento no corpo humano e, assim, elimine a doença. Interessam-se também em descobrir por quê algumas pessoas permanecem anos sem sintomas e, em outras, a doença se manifesta rapidamente.

A motivação de outros cientistas é entender como duas células muito diferentes se reconhecem mutuamente. No caso da doença de Chagas, quando o T. cruzi entra num organismo, ele precisa entrar numa célula para continuar se transformando e seguir seu ciclo de vida. É nesse processo que ele produz doenças no ser humano. É isso que alguns pesquisadores procuram compreender: como o protozoário reconhece a célula que irá abrigá-lo e como penetra nessa célula.

Epidemiologia

A Epidemiologia é a disciplina fundamental da Saúde Coletiva, com muitas conexões interdisciplinares, pois se dá em diversos níveis: social, ambiental, comportamental, clínico e molecular.

O pano de fundo para a investigação epidemiológica são as profundas transformações que ocorrem nas condições de saúde das populações humanas, bem como as mudanças em suas causas potenciais. Esta é uma das áreas de pesquisa que interage com as Ciências Sociais, como a Sociologia, a Estatística, a Economia e a História. Isso ocorre porque a promoção da saúde requer muitas vezes intervenções sócio-econômicas para redução da pobreza, melhoria das condições de vida e saneamento do meio ambiente.

Como o país lida com essas doenças?

O Ministério da Saúde criou em 1990 o Centro Nacional de Epidemiologia (Cenepi), que tem tido grande influência na análise da saúde populacional e no planejamento e gerenciamento de ações. Foi desenvolvido desde então um sistema de treinamento de grande abrangência, com mais de 30 centros oferecendo pós-graduação em Epidemiologia.

A dengue, por exemplo, era uma doença que estava aparentemente controlada e de repente se tornou um problema grave para o Brasil. Isso ocorreu por vários motivos, principalmente de política de saúde pública. As ações para prevenir a doença foram transferidas do Governo Federal para os municípios, sem que estes estivessem capacitados e treinados para receber essa responsabilidade. Foram extintos os setores no Ministério da Saúde que eram responsáveis por esse controle – a Sucam e a Fundação Nacional de Saúde. Atualmente, o Ministério está fazendo todos os esforços possíveis para reparar os danos das ações anteriores.

Ações necessárias vão além da pesquisa científica

A luta contra a doença é multidisciplinar: envolve pesquisa clínica, pesquisa em saúde pública e pesquisa biomédica. E uma solução para o lixo e a sujeira. Nossa sociedade gera resíduos persistentes e o trabalho de saneamento não está sendo feito de forma adequada. As caixas d’água são mal vedadas e as inúmeras lajes abrigam poças, que são os maiores criadouros do mosquito. Esse aspecto é do âmbito da saúde pública. O sucesso do enfoque multidisciplinar é evidenciado, por exemplo, no caso de um grupo de físicos brasileiros que desenvolveu, junto com químicos, biólogos e médicos, o uso de nanotecnologia aplicada a um kit diagnóstico.

Pesquisadores de vários países colaboram entre si

O desafio de erradicar a dengue e outras epidemias levou a Fundação Oswaldo Cruz (Fiocruz), sediada no Rio de Janeiro, mas com braços em diversos estados do país, a iniciar uma atuação conjunta com outros países da América Latina e Caribe, através de programas internacionais de formação de recursos humanos. São cursos de mestrado e doutorado oferecidos pela instituição em Medicina Molecular, Saúde Pública, Epidemiologia, Desenvolvimento Tecnológico de Imunobiológicos. Existem redes colaborativas em pesquisa e desenvolvimento para disponibilizar medicamentos eficazes e acessíveis financeiramente aos países necessitados.

Imunologia

A área de Imunologia é muito rica em possibilidades. O sistema imune é capaz de identificar moléculas de dentro e de fora do organismo, é capaz de interagir com outros sistemas fisiológicos do corpo, e determinar se os nossos tecidos estão saudáveis ou lesionados. É através do sistema imune que o organismo responde a infecções causadas por bactérias e vírus, e reage contra tumores neoplásicos em formação.

Como o sistema imunológico funciona?

O sistema imunológico funciona através de células que carregam dois tipos de receptores: um deles envolve os receptores geneticamente diversificados, que reconhecem a identidade molecular de cada célula, através de pequenos peptídeos resultantes do seu metabolismo proteico. Estes receptores são expressos em linfócitos.

O outro tipo trata de receptores que reconhecem moléculas resultantes de destruição celular e que são expressos por células fagocíticas, evolutivamente mais primitivas. Estes receptores acionam e amplificam a resposta imune, além de reconhecerem também estruturas presentes em bactérias e vírus.

Entender como essas células e seus receptores interagem e ganham um significado conjunto, como o corpo decide se as respostas imunes serão nocivas a nós, a uma bactéria, ou a nenhum dos dois, é um dos principais desafios da imunologia moderna.

Um exemplo de área de pesquisa

Um caso interessante de estudo, pelo qual diversos pesquisadores se interessam, é o dos tumores neoplásicos (câncer), que afetam uma pequena parcela dos indivíduos expostos. Por um motivo ainda desconhecido, ao invés de terem uma reação imunológica localizada eficiente, que levaria à cura do tumor, algumas pessoas desenvolvem uma resposta sistêmica, que gera alterações imunológicas, hormonais e metabólicas, podendo levar a disfunções de inúmeros órgãos. Além disso, as células do sistema imune, que são recrutadas para o local do tumor, são alteradas metabolicamente, e passam a ajudar o tumor a crescer, ao invés de destruí-lo. O objetivo da pesquisa é identificar as moléculas responsáveis por esta diferenciação anômala de fagócitos e linfócitos e redirecioná-los para uma resposta eficiente contra o tumor.

Indústria Farmacêutica

Um dos principais objetivos dos países em crescimento é reduzir sua dependência das empresas multinacionais e fazer os preços caírem. Na área da Saúde, o foco são os preços – e a qualidade – dos medicamentos.

Política dos genéricos é exemplo mundial

O Brasil produz atualmente cerca de 80% dos medicamentos usados internamente. A indústria farmacêutica suporta o consumo nacional. O maior exemplo disso é o sucesso dos medicamentos genéricos brasileiros. Com a regulamentação dos genéricos, batemos o recorde mundial de suficiência: em dois anos, os medicamentos estavam nas farmácias. Isso não aconteceu em nenhum lugar do mundo.

Temos uma excelente legislação para a produção de medicamentos com boa qualidade de fabricação, nivelada com o padrão internacional. Porém, importamos cerca de 80% dos fármacos, que são os componentes para produzir os medicamentos, principalmente da Índia e da China. Modificar esse quadro é fundamental.

Faltam gestores de ciência e tecnologia

Temos ótimos pesquisadores para resolver a pesquisa na bancada dos laboratórios. Temos lá na outra ponta eficiência na engenharia de produção. O Brasil tem a defesa e o ataque, mas falta o meio de campo para transformar o conhecimento em produtos. Nosso país está atrasado na formação de gestores de tecnologia e de profissionais para atuarem em direito patentário. São ainda poucas as iniciativas neste sentido: um exemplo é a Agência de Inovação (Inova), da Unicamp.

Empresários precisam investir em inovação

A nossa indústria precisa investir em pesquisa e desenvolvimento, em inovação. Não podemos viver a reboque do conhecimento produzido nos países mais avançados, temos que construir nosso próprio caminho.

O processo de inovação na indústria é como o desenvolvimento de um atleta: é preciso muito treinamento, apoio e investimento para que um dia ele se destaque e chegue a bater um recorde. E é disso que o país precisa: de empresários com visão de futuro, dispostos a investir na inteligência brasileira. E já há casos de sucesso, como a Natura, empresa de cosméticos 100% brasileira.

Metagenômica

A Metagenômica usa a tecnologia genômica para conhecer a ecologia do universo microbiano e aproveitar seu vasto potencial biotecnológico. Os pesquisadores dessa área estudam os microorganismos surgidos na Terra há 3.8 bilhões de anos, que correspondem hoje a 60% da biomassa da Terra.

Para que serve estudar os micróbios com esta tecnologia?

Conhecer os microorganismos é importante para esclarecer os processos evolutivos. A maioria dos micróbios não causa doenças, sendo de alto interesse biotecnológico e da indústria farmacêutica. Mas só conhecemos em torno de 1% deles. Se já tiramos proveito deste pequeno recorte, imagine o potencial dos 99% que desconhecemos ainda…

O clima global, por exemplo, é afetado por microorganismos, dado que o ciclo microbiano de carbono e nitrogênio mantém a Terra habitável, pois metade do oxigênio da Terra é produzido por micróbios. O padrão de diversidade de microorganismos de um ambiente pode nos ajudar a monitorar e predizer mudanças ambientais.

Onde estão os metagenomas?

Desde uma gota de orvalho numa folha como dentro de uma geleira, podemos encontrar organismos que estão adaptados para viver nessas condições especiais. Estes microorganismos que vivem em situações extremas são chamados extremófilos, a maioria pertencendo à classe das arquéias. Um exemplo interessante de arquéias são as que vivem em fontes hidrotermais submarinas, sob condições extremas de temperatura e pressão (esses organismos podem crescer a temperaturas entre 80 e 100ºC e em profundidades de 2 mil a 3 mil metros). As pesquisas sobre metagenomas podem ser realizadas também em reservatórios ou compartimentos de água, como a Amazônia, por exemplo.

Poucas iniciativas ocorreram até hoje no Brasil em relação a esta megadiversidade desconhecida, o que significa que há muito o que fazer e, portanto, muitas oportunidades para pesquisadores interessados.

Nanobiotecnologia

Esta é uma Ciência multidisciplinar que envolve Biologia, Medicina, Química, Física, Engenharia, Matemática e Informática, que se unem no desenvolvimento de novos materiais e novos processos que possam contribuir para solucionar os problemas mundiais.

As quatro revoluções industriais

Dizem os estudiosos da história da Ciência que a primeira revolução industrial foi caracterizada pelo uso dos motores a vapor; a segunda pode ser identificada pela utilização de motores a combustão e elétricos; a terceira revolução industrial veio com os computadores, chips, microchips e sistemas de comunicação em massa; e a quarta revolução ocorreu com o advento da Nanotecnologia. A ferramenta de estudo que permite o acesso a esse mundo nanométrico – da bilionésima parte do metro – é o microscópio de força atômica.

Bionano ou Nanobio?

A mescla da Biotecnologia com a Nanotecnologia origina duas novas áreas. A Bionanotecnologia é caracterizada pela exploração e conhecimento das estruturas presentes nos sistemas biológicos que mantêm a vida como a conhecemos hoje.

Já a Nanobiotecnologia visa desenvolver sistemas baseados nesses arcabouços iniciais da vida ou outros que possam interagir com essa vida – seriam os estudos visionários que, por exemplo, propõem que um pequeno robô possa ser criado para agir especificamente numa célula tumoral.

Focos de destaque

O Brasil ainda está começando a trabalhar em Nanotecnologia e Nanobiotecnologia, mas já tem pesquisas de ponta, especialmente nas áreas de agricultura e sistemas de alimentos; energia limpa e recursos energéticos; química e petroquímica; pigmentos, tintas e superfícies funcionais; controle sanitário e recursos hídricos; saúde humana e animal; metais, siderurgia, indústria cerâmica e do vidro; nos setores automotivos, têxteis, cosmética etc.

Exemplos de pesquisas na área

Um dos tipos de pesquisa que está sendo feita, por exemplo, é a investigação do tamanho e forma das hemácias (glóbulos vermelhos) do sangue, com o objetivo de caracterizar estas células de diferentes vertebrados tanto em condições normais como em condições alteradas. O objetivo é facilitar o diagnóstico e oprognóstico de doenças e infecções.

Também se pode fazer a bioprospecção de moléculas bioativas, tanto de organismos da biodiversidade brasileira quanto da região antártica, por exemplo. Os pesquisadores buscam, por exemplo, moléculas com resistência ou tolerância ao frio, com atividade anticongelante, antimicrobiana, antioxidante e com capacidade de absorver raios ultra-violetas.

Alguns cientistas têm interesse em buscar moléculas resistentes a patógenos, visando o desenvolvimento de variedades de plantas e animais, e que possam ser usadas com outros fins – para a criopreservação de células, tecidos, órgãos e organismos; para congelamento, segurança alimentar e no armazenamento de alimentos com embalagens bioativas. A pesquisa sobre os fios tecidos pelas aranhas de diferentes espécies, estudando sua alta elasticidade e força tênsil, pode gerar o desenvolvimento de biomateriais, nanofibras e outros.

Neurociência

É a área da ciência que busca compreender a habilidade do cérebro de estocar, esquecer e recuperar informações e a capacidade humana de criar arte e de tomar decisões inteligentes, questões essenciais para o avanço do conhecimento.

A elucidação da natureza da consciência, da inteligência e das doenças associadas a defeitos na estrutura do cérebro são de elevada importância para a sociedade contemporânea, porque os humanos conquistaram um alto grau de longevidade e este benefício foi acompanhado pelo surgimento de algumas novas doenças, como o mal de Alzheimer.

Conhecimento gera conhecimento

A Neurociência ainda está no jardim de infância, quando comparada com o grau de desenvolvimento de um ser humano. Seu estudo começou na virada do século XIX, através da descrição e localização de diferentes segmentos do cérebro. Justamente por ser uma “ciência nova”, é um dos campos com mais coisas a descobrir, pois o cérebro humano ainda é uma incógnita para os cientistas.

Os avanços na Biologia Molecular, porém, assim como o progresso da computação vêm permitindo um avanço cada vez maior na área e a abordagem de problemas e questões que eram inimagináveis há 20 anos. Hoje são feitos experimentos com humanos, não-invasivos, nos quais se estimula o indivíduo de alguma forma e ao mesmo tempo se vê quais os locais do cérebro que são ativados com aquele tipo de estímulo – a visão de imagens atraentes ou repulsivas, por exemplo -, através de aparelhos de ressonância magnética. Esses aparelhos foram desenvolvidos graças a avanços recentes na Física, o que nos leva a observar que a ampliação do conhecimento numa área pode levar a avanços em outras.

Exemplo de pesquisa

Uma pesquisa interessante na área busca entender os mecanismos das motivações e emoções humanas no campo das interações sociais.

Algumas conclusões do estudo levam a crer que, ao contrário do que propõe a sociedade atual, o ser humano é um ser social e não individualista. De acordo com a pesquisa, que investiga as regiões do nosso cérebro atingidas por determinados atos e emoções, ações não-egoístas promovem uma felicidade mais duradoura do que ações que visem somente o bem-estar individual.

Novas Terapias Celulares e Genéticas

As pesquisas com células-tronco, com as novas políticas aprovadas no país, estão avançando. Há uma imensa diversidade de aplicações possíveis para as pesquisas nessa área.

Lei no Brasil

Nossa lei permite que sejam feitas pesquisas com embriões congelados há mais de três anos, ou inviáveis para a implantação, desde que haja o consentimento dos genitores, dos pais. Quem for contra por qualquer motivo, não vai doar seus embriões e ninguém vai mexer neles. Essas pessoas que são contra as pesquisas estão protegidas. As pesquisas têm que ser aprovadas por comitês de ética das instituições.

Como controlar o processo?

O controle do processo de diferenciação celular é o grande segredo, é o foco das pesquisas em células-tronco. As células embrionárias, chamadas de células-tronco totipotentes, têm a capacidade de formar um ser completo, quando o óvulo passa a se dividir, se for fecundado.

Como isso ocorre no organismo ninguém sabe ainda. Como a célula recebe a ordem de “você vai se transformar em músculo, você vai se transformar em osso” é o grande segredo que os cientistas querem entender. Este é um ponto chave: imaginem o desastre que seria se injetarem células-tronco para regenerar um músculo e a célula “resolver” virar osso! Como evitar a formação de tumores, a rejeição, e como garantir que as células-tronco cheguem no órgão-alvo? É para isso que os pesquisadores trabalham, para encontrar essas respostas.

Tratamentos com células-tronco estão apenas começando

Isso abriu, também, novas perspectivas de tratamento – as chamadas terapias gênicas – que podem revolucionar a medicina regenerativa. Mas ainda estamos na fase de pesquisas: ainda temos um tempo pela frente até termos realmente formas de tratamento. Para se fazer estudos clínicos em humanos utilizando células embrionárias humanas ainda é necessária uma série de considerações éticas e legais.

Já existem técnicas de utilização de células-tronco de medula óssea em terapia em doenças humanas. A grande vantagem dessas células é que elas são retiradas do próprio paciente, não havendo assim nenhum problema de rejeição. Este tipo de terapia celular já é utilizado em estudos clínicos ainda não completados, para tratar doenças como o acidente vascular cerebral encefálico isquêmico (AVC, também conhecido como derrame cerebral). Ela potencializa a capacidade de recuperação do próprio sistema nervoso e, portanto, reduz as sequelas causadas por aquele AVC. Não se espera ainda, no entanto, que o paciente saia da terapia como era antes do AVC, mas sim com menos sequelas do que sairia sem a terapia.

Estudos são conduzidos em diversas instituições

O maior estudo que está sendo realizado no país sobre terapias celulares com células tronco-adultas de medula óssea é coordenado pelo Instituto Nacional de Cardiologia de Laranjeiras, no Rio de Janeiro. É um estudo nacional, financiado pelo Ministério da Saúde, com 33 hospitais envolvidos e 1.200 pacientes, dos quais 600 recebem as células-tronco e os outros não.

Esta é uma iniciativa muito importante do Ministério da Saúde, pois não há interesse da iniciativa privada de financiar estes estudos. As doenças estudadas são casos extremamente graves, que esgotaram todas as possibilidades de tratamento. É um tipo de estudo chamado de “duplo cego”: nem o paciente nem os médicos sabem se o indivíduo vai receber as células ou não.

Oncologia

As pesquisas sobre câncer são mais avançadas nos países desenvolvidos, pois a incidência de casos é maior. Mas já sabemos que quanto mais cedo o câncer for detectado, mais fácil e barato é o tratamento. Daí a razão de todos os países investirem intensamente no aperfeiçoamento dos diagnósticos e da avaliação prognóstica.

Pesquisa comparativa

Os cientistas que se interessam por essa área estudam, por exemplo, os mecanismos que uma célula utiliza para ativar e desativar o funcionamento de genes importantes para o seu desenvolvimento.

Estudam simultaneamente dezenas de milhares de genes em células humanas normais e os comparam com células com câncer, buscando identificar quais os genes ativados e inibidos nestas últimas que possam ser utilizados como marcadores do câncer ou marcadores do grau de agressividade daquele câncer. A ideia é entender o que faz uma célula ficar desregulada e levar à sua proliferação descontrolada.

Entre a cruz e a caldeirinha

A pesquisa sobre os mecanismos moleculares relacionados ao controle do ciclo celular em mamíferos é uma área que fica na interface entre envelhecimento celular e câncer.

Neste setor, o desafio prático é como impedir o crescimento de tumores e ao mesmo tempo estimular a proliferação das células normais já que, biologicamente, os processos que destroem os tumores também inibem a multiplicação celular. Com isso, células novas deixam de ser geradas e os organismos envelhecem.

Compreender este fenômeno pode ajudar, portanto, no tratamento sistêmico das doenças degenerativas que acompanham o envelhecimento humano.

Características necessárias

As características para ser um bom pesquisador na área das Ciências Biomédicas são praticamente as mesmas da carreira de Ciências Biológicas. Antes de tudo, é preciso ter vontade de trabalhar com o assunto. Assim como em qualquer profissão, é fundamental gostar do que se faz, ter interesse.

O trabalho não deve ser encarado como uma obrigação, mas como um prazer em aprender sempre mais, colaborar com outros cientistas, interagir com a sociedade e contribuir para a melhoria da qualidade de vida das pessoas.

Para ser um cientista, o jovem tem que ter motivação. Não basta só querer, tem que sentir prazer na atividade científica e, para realizar os experimentos, ter um equilíbrio entre o pensamento e as mãos.

É importante ter curiosidade, para questionar o ambiente em que se vive e então buscar descobrir como ele funciona, incentivado por um espírito de investigação. A preocupação com a saúde pública também é outro atributo desejável: preocupar-se com o outro é uma boa parte da motivação na área.

Persistência também é importante. Descobertas significativas costumam requerer muito tempo e dedicação. Os erros devem ser avaliados e reaproveitados como lições. Portanto, a pessoa precisa lidar bem com a frustração: saber cair e levantar, sacudir a poeira e recomeçar!

A capacidade de observação acurada é indispensável. Isso inclui dar atenção a detalhes. Também ajudam nesse sentido as capacidades de análise (saber separar o joio do trigo), de concentração (ficar horas pensando em um único problema) e de organização (para facilitar a compreensão e o avanço dos estudos).

Como a Matemática é a linguagem que o cientista usa para tentar compreender a natureza, é importante ter facilidade para lidar com ela. Todas as hipóteses a respeito dos objetos estudados deverão estar apoiadas em dados, para que possam ser validadas e reproduzidas.

Finalmente, é preciso saber que não se trabalha sozinho. Pesquisadores das mais diversas áreas atuam numa rede de colaboração e solidariedade. Embora existam gênios na história da ciência, é bom lembrar que uma descoberta raramente é resultado de uma única cabeça. Por tudo isso, é importante saber trabalhar em equipe, sem abrir mão da autonomia necessária pra desenvolver a parte que cabe a cada um e mantendo sempre a visão do todo.

Nesse ambiente de convívio, portanto, não se pode abrir mão da boa comunicação oral e escrita, para deixar claro o que se faz e o que se pede, além de favorecer o estabelecimento de um ambiente de trabalho agradável.

Fonte: ProfiCência

Flávio Hastenreiter
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